Contraste

Domingo á tarde. Desço a ladeira que vai dar na casa do meu irmão. Da calçada, vejo um corredor estreito, fechado por um portão alto, de ferro. Atrás dele, cochilando, está sentada uma anciã. Cabelos desgrenhados, cuja tintura alourada teima em esconder o branco inevitável da idade, ela é a própria imagem da solidão e tristeza. A mensagem que me passa é – “minha vida acabou”... Sinto pena dela. De seu ar desiludido, do seu jeito desleixado, de suas esperanças perdidas... Tudo se esvaiu no tempo, e ficou apenas a solidão de uma cadeira num corredor estreito, numa tarde de domingo. Chego em casa.Dirijo-me á cozinha, onde encontro minha mãe. Cabelos profundamente brancos, impecavelmente penteados. A roupa simples, trajada com elegância. Os pés, ainda que tão doentes, a se mover para lá e para cá enquanto apanha vasilhas, abre o forno, fecha a geladeira... As mãos ágeis preparam os quitutes do lanche da tarde – afinal, a família está reunida! Não digo nada, mas em minha mente comparo as duas anciãs. Uma, trancada num corredor, sonolento e desiludida. A outra, ágil e hábil, preparando com esmero o lanche gostoso para o esposo e filhos. E penso no contrastes desta vida... Não me cabe julgar a outra, a do corredor. Não sei quais foram suas lidas e lutas. Que enfermidades enfrentou – ou enfrenta. Que tristeza teve ao longo da vida... Nada sei sobre ela. Longe de mim o julga - lá, portanto! Mas conheço a “minha” anciã. Sei que também teve lutas. E lindas... Quantas lindas! Mas de alguma forma, pela graça de Deus, as venceu. Não trás consigo a imagem da desilusão, da desesperança, da amargura... A diferença entre ambas bem pode estar na fé. Minha mãe enfrentou a vida com Jesus. Ele foi o seu refúgio e fortaleza, socorro bem presente nas tribulações. Sendo assim, cumpriu sua promessa para com ela: “Na velhice darão ainda frutos, cheio de seiva e de verdor” (SL 92.14). Talvez esteja ai a razão do contraste que observei neste domingo á tarde...